A Questão da Ordenação Feminina na IPB-6: Um Resumo

Como muita gente não tem tempo ou paciência para ler longos artigos, vou tentar resumir a posição do ilustre Prof. Dr. Waldyr Carvalho Luz, meu professor no Seminário de Campinas e colega na UNICAMP, acerca da Ordenação Feminina para os Ofícios Eclesiásticos (Pastorado, Presbiterato, e Diaconato).

Mesmo para quem acredita que a Bíblia foi inspirada por Deus e contém a revelação divina que orienta o Cristianismo (como Waldyr Luz acreditava), é preciso reconher que ela foi escrita por homens (mesmo os livros que contam história de mulheres, como o de Ester), e reflete a sociedade, a cultura, os usos e costumes de um povo, o israelita, mais tarde chamado de judeu, que era, inegavelmente, patriarcal e machista (como, de resto, todos os demais povos daquela época e daquela região do mundo). Na Palestina daquele tempo (cerca de 1000 aC até 100 dC) era crença comum e não contestada que o homem era um ser superior à mulher. A tese da supremacia masculina em relação à mulher era, naquela época (e por muito tempo, antes e depois, e em outros locais, questão pacífica, indiscutível. Isto é pacífico e inquestionável.

Em decorrência dessa firme convicção da superioridade e da supremacia masculina em relação à mulher, a Bíblia não proíbe e não censura certas “vantagens” ou “direitos” masculinos, na época inquestionáveis, mas hoje inadmissíveis, como, por exemplo:

(a) as propriedades e os demais bens de um casal devem ser controlados e administrados pelos homens, não pelas mulheres (que, não raro, eram consideradas, elas próprias, propriedades do marido, podendo até ser vendidas, trocadas, doadas, ou cedidas, para evitar problemas, como Sara, mulher de Abraão, o foi, por pelo menos duas vezes);

(b) os homens podiam legalmente ter várias mulheres, entre esposas (a poligamia era padrão), concubinas, e servas que lhes prestavam serviços sexuais (como parte de seus deveres domésticos, não como prostitutas), em especial quando era necessário produzir descendentes que não eram gerados pelas mulheres legais (que frequentemente pareciam ter dificuldades para engravidar em tempos bíblicos), não tendo as mulheres direitos iguais ou equivalentes;

(c) os homens podiam se divorciar de suas mulheres, se não estivessem satisfeitos com elas, não tendo as mulheres o mesmo direito, em iguais circunstâncias.

E por aí vai.

Para o Prof. Waldyr, as passagens bíblicas que determinam:

(A) que a mulher casada deve obedecer ao marido e ser submissa a ele em tudo;

(B) que a mulher deve ficar calada na igreja, consequentemente não podendo explicar a Bíblia, ensinar, pregar, etc.; e,

(C) que a mulher não exerça funções decisórias, executivas, pedagógicas ou proclamatórias dentro da Igreja.

Todas essas determinações são exatamente da mesma natureza que aquelas mencionadas nos quatro parágrafos atrás (contando a partir do que começa com “Em decorrência”).

Hoje em dia, nenhuma sociedade civilizada, pelo menos no Ocidente, adota esses usos e costumes, considerados primitivos (embora eles ainda continuem a ser adotados em alguns países do Oriente Médio que seguem a religião islâmica).

Na verdade, alguns desses “direitos masculinos” (entre aspas) dos tempos bíblicos são hoje crimes, na maioria dos países ocidentais. Se você é homem, tente viver, hoje, como o Rei Salomão vivia então, para ver onde você vai parar…

O tempo passou, os usos e costumes mudaram, as mulheres conseguiram total igualdade de direitos com os homens, e, ao longo da segunda metade do século 20, “se liberaram”, vieram a poder trabalhar fora de casa, podendo exercer qualquer cargo ou função disponível para os homens, como, por exemplo, os de Presidente República, Primeiro Ministro, General (ou Marechal) nas Forças Armadas, Presidente e Principal Executivo das maiores empresas do mundo, Professor Titular das principais Universidades do mundo, Cientista Chefe dos maiores Laboratórios de Pesquisa do mundo, etc.

Segundo o Prof. Waldyr, em todas as áreas mencionadas alguns parágrafos atrás, a visão de mundo que um dia considerou quase naturais esses usos e costumes, e supostos direitos masculinos, fazia parte apenas do contexto cultural do mundo em que em que a Bíblia foi produzida, e não deve ser considerada parte da revelação que se acredita estar contida na Bíblia (a menos que se adote o “pacote inteiro”, com poligamia e tudo, como fazem os países islâmicos, em especial o Irã).

A visão de mundo que um dia justificou esses usos e costumes, e supostos direitos masculinos, simplesmente não é mais aceita, no Ocidente, e, o que é mais importante, não é aceita por razões plenamente justificáveis, aceitas basicamente por todos – exceto pelos homens que dirigem e comandam a Igreja Católica Romana e a Igreja Presbiteriana do Brasil (neste caso, não por todos, mas pela maioria deles, que não permitem que as regras sejam alteradas na Igreja Presbiteriana do Brasil, como um dia o foram na Igreja Presbiteriana Independente do Brasil, por iniciativa de meus amigos (alguns deles colegas), os Revs. Assir Pereira, Leontino Farias dos Santos, Abival Pires da Silveira, e outros.)

À vista disso, argumenta o Prof. Waldyr, não adianta, porque isso nada prova:

  1. ficar citando livro, capítulo e versículo da Bíblia, que incontestavelmente afirma que a mulher é apenas uma auxiliadora ou ajudante do homem, e que este, portanto, é o cabeça do casal ou o chefe da sociedade conjugal;
  2. ficar citando versículos bíblicos que afirmam que certas funções, no lar, na sociedade, em geral, e nas instituições que a compõem, funções como educar, dirigir e governar, são privativas de homens, e, portanto, não podem ser exercidas por mulheres.

Esses fatos não devem nem sequer entrar na discussão, por serem irrelevantes. Eles são pacíficos e concedidos por todo mundo que se dispôs a estudar o assunto. Os Presbiterianos Independentes podem simplesmente conceder esses fatos, dispensando-se de fazer ginásticas exegéticas para provar que a Bíblia está do lado deles neste caso.

O argumento do Prof. Waldyr, e eu dou graças a Deus pelo fato de que ele o formulou e divulgou antes de morrer, quando já tinha 94 anos, é que esses usos e costumes, embora estejam presentes na Bíblia, fazem parte apenas do contexto cultural do mundo em que a Bíblia foi gerada e produzida, não fazendo parte da revelação que a maioria dos cristãos considera que ela contém.

Quem quiser criticar e rebater a decisão da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil tem de refutar essa tese meta-bíblica, não ficar simplesmente desfiando versículos bíblicos que apenas provam que os autores dos livros bíblicos eram filhos culturais do seu tempo.

É essa a posição do Prof. Waldyr. Punto y basta.

Eu a endosso 100%, embora não seja membro, hoje, nem da Igreja Presbiteriana, nem da Igreja Presbiteriana Independente.

Em Salto, 14 de Abril de 2025

Eduardo Chaves



Categories: Liberalism

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