O Liberalismo Teológico – Uma Nota

O Liberalismo Teológico:

O Liberalismo Teológico não é um conjunto de doutrinas e crenças que todo adepto da Teologia Liberal precisa aceitar para ser considerado um liberal de boa fé (bona fide). Nele (no Liberalismo Teológico) não existem credos e confissões que todo liberal precisa aceitar para poder se considerar um liberal sem questionamentos. Nele não existem doutrinas definidas como certas (recta doctrina) e obrigatórias para todos. Logo, nele não existe ortodoxia — o pensamento certo, correto, de todos aprovado — nem heresia — o pensamento errado, dissonante, desviante. Não existindo heresia, tampouco existem hereges. Inexistindo hereges, não há perseguição nem expurgo deles, os que ousam pensar, ou conduzir sua vida, de forma diferente. Nem, muito menos, fogueiras para a sua execução, em fogo lento, a fim de que sofram ainda mais pelo horrendo crime de pensar diferente, de pensar por si próprios. Inexistindo hereges, também inexistem, dentro do Liberalismo Teológico, os ortodoxos, que se julgam melhores do que os restantes e no direito de julgar e punir os que deles discordam. Um liberal teológico ortodoxo é uma verdadeira contradição de termos.

O Liberalismo Teológico é um jeito e uma forma de:

(a) entender o Cristianismo;

(b) de relacionar o Cristianismo com o mundo em que ele está inserido;

(c) de ler e interpretar a Bíblia, a Tradição, e o Pensamento Teológico Pregresso;

(d) de fazer Teologia para o presente e para o futuro.

Para fazer isso, o Liberalismo Teológico:

(i) procura identificar, definir e preservar a essência da herança recebida;

(ii) está disposto a acomodar o não essencial às novas realidades em que o Cristianismo precisa se situar.

Quem não aceita esses postulados geralmente não vem para o Liberalismo Teológico. Mas se, por absurdo, quiser vir para o arraial liberal, virá, será bem-vindo, e ficará ali até quando quiser sair (se isso vier a acontecer), porque ninguém ficará incomodado com ele, nem, muito menos, tentará impedi-lo de pensar como acha que deve pensar, e agir como acredita que deve agir, e, muito menos, tentará puni-lo por pensar e agir assim.

O Liberalismo Teológico é aberto, amplo, latitudinário, acomodatício, acolhedor. Nem digo que é tolerante, porque é a tolerância que se define pela sua postura liberal. Quem quiser vir para o Liberalismo Teológico, ou nele ficar, vem e fica como é e como está.

Na Igreja Presbiteriana Americana, quando os liberais teológicos, depois de sofrer perseguição e expurgos (felizmente não chegou a haver fogueiras na Inquisição de lá), alcançaram a maioria dentro da igreja, através do apoio dos moderados, eles não perseguiram nem colocaram para fora da igreja fundamentalistas e conservadores como J. Gresham Machen e John Gerstner. Estes ficaram lá até o momento em que eles próprios resolveram sair — Machen, logo, Gerstner, bem depois, já quase no fim de sua vida.

O movimento conhecido como “Liberalismo Teológico”, que existe desde os primórdios do Cristianismo, não tem esse nome por acaso. Seus adeptos prezam a liberdade de pensar e de agir, e, por conseguinte, de ser cristãos como sua mente e sua consciência acham que devem ser. E não negam esse direito para ninguém.

Se Paulo de Tarso houvesse sido obrigado a ser cristão judaizante, como Pedro e Tiago, não haveria Cristianismo, hoje, como uma opção religiosa independente. O Cristianismo não seria nada mais do que uma variante do Judaísmo Ortodoxo, só que com Cristo. Paulo, se a gente descontar o próprio Jesus de Nazaré, foi o primeiro liberal teológico, à sua moda (como são todos os liberais teológicos, do seu jeito, “their way“). Ele acomodou o Cristianismo Judaizante e Apocalíptico da Palestina Judaica à realidade do mundo greco-romano pluralista, inclusive no tocante à religião. Para ele, em seus momentos de maior clarividência, não havia nem judeu, nem grego, nem romano. Nem homem, nem mulher. Nem senhor, nem escravo. Havia apenas, e simplesmente, gente.

Uma palavra final: O Liberalismo Teológico não está a fim de proselitizar. Por isso, não “missionariza”. Vem para cá [a essas alturas não deve haver dúvida de que eu sou um liberal, não só no sentido político, mas também teológico], quem procura e acha interessante.

[Essência de um artigo que comecei a escrever sobre “A FATIPI e o Liberalismo Teológico“, a propósito de um podcast disponível no Youtube e no Spotify. Esperava publicar o artigo logo depois que o podcast foi divulgado, mas ele cresceu, de certo modo tomou vida própria, e está virando um ensaio, já com 60 páginas, sobre “A Teologia Liberal: Seu Conceito e sua História“. A divulgação desta “essência” do artigo, agora ampliada ao ponto de redefinição, tira um pouco da pressão que eu próprio coloquei sobre mim para publicar o ensaio logo, mesmo que meio inacabado… (porque, caso contrário, a crítica ficaria muito distante, no tempo, do fato gerador). Com este “preview“, ou “trailler“, a posição está marcada. Eduardo Chaves, 2.6.2023, com pequenas correções e revisões nos dias seguintes.]



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