Gigs

Há certo consenso no ar hoje em dia de que a época do emprego acabou pra valer. “Emprego” aqui quer dizer trabalho fixo, de duração ilimitada, em tempo integral (9 às 17h), com perspectiva de progressão na carreira e garantia de fins de semana e feriados remunerados, férias, aqui no Brasil 13o salário, cobertura de plano de saúde, e outros benefícios (licença maternidade e paternidade, licença gala, licença nojo, etc., por exemplo).

Emprego é trabalho à moda antiga, em que uma pessoa trabalhava para uma empresa, ou instituição, ou órgão governamental, não raro, a vida inteira, ganhava relógios valiosos ou outros prêmios quando completava 20, 25, 30, 35, às vezes até 50 anos no emprego, e uma bela festa quando se aposentava.

Hoje isso não existe mais. O emprego acabou — ou está acabando rápido. Mas isso não significa que não haja mais trabalho remunerado (embora não na forma de salário).

Os americanos inventaram ou adaptaram o termo “gig” para se referir ao trabalho típico de hoje.

Parece que o termo “gig” tenha tido origem na área artística, especificamente musical, em que um cantor ou os membros de uma banda de jazz não tinham um emprego fixo numa determinada casa noturna ou restaurante, com carteira assinada e tudo (como é o costume no Brasil para empregos fixos). Eles tinham um gig — isto é, um trabalho (cantar ou tocar, todas as noites ou nas 5as, 6as, e sábados), remunerado de alguma forma, por um tempo limitado — ou por um tempo não fixado, mas que pode terminar a qualquer momento sem gerar direitos, reivindicações, multas e indenizações.

O termo se estendeu para qualquer acerto de trabalho, em qualquer área, por qualquer período de tempo, em troca de um pagamento acordado. Quem presta serviço mais ou menos regular a uma entidade qualquer (empresa, ONG, até mesmo órgão governamental), como PJ (Pessoa Jurídica), pode até assinar contrato, mas será um contrato de B2B (Business to Business), revogável a qualquer momento por iniciativa de qualquer uma das partes, em geral exigida apenas uma notificação com antecedência mínima de 15 ou 30 dias. Esse contrato regula (precariamente) um gig, não é um contrato de emprego parecido com aqueles regulados pela CLT. Estes estão sumindo e vão acabar. No gig, o trabalho dura enquanto durar a necessidade de quem compra a prestação de serviço ou o interesse do prestador.

A frase “Amanhã à tarde não dá: eu tenho meu gig nessa hora” significa que você estará trabalhando em um gig amanhã à tarde.

Em nossa era, os empregos estão virando gigs. A vantagem é que você pode ter vários gigs simultaneamente: eles raramente exigem tempo integral e dedicação exclusiva. Especialistas predizem que, nos EUA, por volta do ano que vem (2020), cerca de 40% dos trabalhos feitos mediante pagamento serão feitos através de gigs, não através de empregos regulares.

Uma economia gig é parte do livre mercado e inclui posições de trabalho temporárias e em tempo parcial que não geram vínculo empregatício. Os trabalhadores convencionais virarão algo parecido com free lancers (frilas) ou profissionais liberais no processo — a maior parte trabalhando a partir de casa.

Uma economia gig subverte a economia tradicional e o mercado de empregos. Isso pode parecer a precarização do trabalho, mas não precisa ser isso — embora claramente represente o fim do emprego.

Em Salto, 11 de Novembro de 2019



Categories: Emprego, Gig, Trabalho

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