Diz ele que a chamada “exceção de verdade” — se eu provo que o que eu disse é verdade, não posso ser acusado de calúnia, difamação ou injúria por tê-lo dito– a “exceção de verdade” só cabe no caso de calúnia, não no caso de difamação e injúria.
O comentarista esclarece (o exemplo é dele): se A afirma que B é corno, e B processa A por difamação e injúria, A é punível, ainda que B seja verdade que B, de fato, é corno.
Ele faz uma ressalva. No caso de difamação e injúria, esclarece, a exceção de verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.
Meu entendimento dessa ressalva é o seguinte. Nessa hipótese, se A afirma que B, um funcionário público, é ladrão, pois rouba no exercício de suas funções, se B processa A por difamação e injúria, mas, no processo, A prova que B de fato é ladrão no exercício do cargo, A não seria punível — a exceção de verdade se aplica neste caso, porque B é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.
Voltando ao caso de calúnia. Refletindo sobre a questão, imagino que caluniar é dizer algo não só ruim mas falso acerca de outrem — e é por isso que a exceção de verdade se aplica aqui. Se A diz algo ruim acerca de B, e B processa A por calúnia (que implicaria que A teria dito uma falsidade a seu respeito), mas A prova, no processo, a veracidade do que disse, A provou, nesse caso, que não caluniou.
Difamação e injúria, por outro lado, podem acontecer mesmo quando A afirma acerca de B algo que é verdadeiro, mas que afeta a fama (reputação) de B e lhe causa injúria (como no exemplo dado pelo comentarista: o caso do corno).
Assim, corrigi, subsequentemente, o parágrafo faltoso, deixando-o com a seguinte redação:
“Uma última observação. Se eu acusar alguém de ser racista (ou ladrão, corruptor de menores, etc.), e, no processo, conseguir provar, com evidências, testemunhos ou argumentos, que a acusação é correta e se justifica, eu não poderei ser acusado de crime de calúnia (porque o que eu disse é verdade) — mas ainda assim posso ser acusado de crime de injúria ou difamação (que podem acontecer mesmo sendo verdade o que se afirma).”
Preciso estudar mais essas coisas… São mais complicadas do que eu inicialmente imaginei. De imediato me surge a questão: se A afirma em público que B é corno, e é processado por B por injúria e difamação, e, no processo, A prova não só que o que disse é verdadeiro, mas também é público e notório, conhecido de todo mundo, cabe a condenação por injúria e difamação? Pode A difamar alguém que já tem pública e notória má fama?
[Procurando na Internet encontrei um site, com o título de ABUSAR.ORG (http://www.abusar.org/manual_de_sobrevivencia_na_selva.html)) em que há um artigo de em que se esclarecem algumas dessas coisas.
[Cito]
“Os tipos de responsabilidade jurídica
Um comentário ofensivo pode gerar dois tipos diferentes de responsabilidade jurídica: a responsabilidade criminal e a responsabilidade civil.
A condenação criminal, em regra, resulta na prisão do culpado, mas em crimes leves – como nos casos de crimes contra a honra – a prisão pode ser substituída por prestação de serviços à comunidade e/ou multa.
A condenação civil é sempre patrimonial e consiste no pagamento de uma indenização à vítima pelos danos sofridos.
Os tribunais têm entendido, corretamente, que somente a pessoa física pode ser vítima de crimes contra a honra. As empresas, portanto, não podem ser vítimas de crimes contra a honra e somente poderão acionar o autor das ofensas no juízo cível.
Responsabilidade penal
Três são as modalidades de crimes contra a honra: calúnia, difamação e injúria.
A calúnia (art. 138 do Código Penal) é a imputação falsa de fato criminoso a alguém. Para a sua caracterização é necessária a descrição do falso crime. Ex: uma postagem na qual o autor afirma que viu Tião Medonho furtando livros na biblioteca na noite anterior. O uso de expressões como “ladrão”, “bandido”, “corrupto”, etc, caracteriza o delito de injúria, não o de calúnia.
A difamação (art. 139 do Código Penal) é a imputação de fato ofensivo à reputação de alguém. Ao contrário da calúnia, aqui não há necessidade de que os fatos sejam falsos. Ex: uma postagem na qual o autor afirma que viu Patrícia Angélica se prostituindo na noite anterior. Mesmo que a informação seja verdadeira, caracteriza-se a difamação. É bom frisar que a simples postagem “Patrícia Angélica é uma prostituta” configura a injúria, pois na difamação deve haver a descrição do fato desonroso.
A injúria (art. 140 do Código Penal) é qualquer ofensa à dignidade de alguém. Na injúria, ao contrário das hipóteses anteriores, não se imputa um fato, mas uma opinião. É caracterizada principalmente pelo uso de palavras fortes: ladrão, prostituta, idiota e, muitas vezes por expressões de baixo calão. Ressalte-se ainda que a injúria terá a pena aumentada se praticada com elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem.
Evidentemente, em todos os casos acima, para a caracterização dos crimes é necessário que as ofensas sejam proferidas contra uma vítima determinada. A afirmação vaga de que “há uma colega na minha sala que é prostituta”, sem a possibilidade de determinar a quem o autor se refere, não configura o crime.
Responsabilidade civil
A ação de indenização por dano moral tem por fim uma reparação econômica pela desonra sofrida.
Inicialmente destinada às pessoas físicas, acabou sendo reconhecida também como instrumento de tutela dos direitos da pessoa jurídica (Súmula 227 do STJ).
Ao contrário da esfera criminal, na qual estão expressamente previstas as condutas proibidas, na esfera cível há tão-somente a determinação que:
Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (art.186 do Código Civil)
Conclui-se, pois, que são necessários os seguintes pressupostos:
1. Ação ou omissão: tanto o autor dos escritos quanto o responsável pelo blog que permitiu a postagem de comentários ofensivos à honra de alguém podem ser responsabilizados pelo dano moral;
2. Dolo ou culpa: age com dolo o agente que agiu ou omitiu-se intencionalmente. Age com culpa quem não desejava o resultado, mas por negligência ou imprudência gerou o dano;
3. Dano: não há responsabilidade civil sem dano. O dano pode ser material (ex: a vítima deixar de fechar um contrato milionário em virtude dos escritos) ou moral (ex: a vítima ter sua respeitabilidade maculada pelos escritos);
4. Nexo de causalidade: é imprescindível comprovar que a ação ou omissão do agente foi a causadora do dano material ou moral. Nota-se que, por sua própria natureza, a responsabilidade civil é, ao contrário da esfera criminal, absolutamente indeterminada, sendo definida pelo juiz na análise de cada caso.
A sugestão de valor de indenização por danos morais feita por advogados não é, por si só, indicativa do valor da indenização ao fim do processo. Esse valor é decidido exclusivamente pelo juiz, após analisar todas as provas juntadas aos autos, inclusive as que comprovarem o prejuízo sofrido.”
[Fim da citação]
Os autores da passagem citada acima são Túlio Lima Vianna (professor de Direito Penal da PUC-MG, Doutorando [UFPR], Mestre [UFMG] em Direito e Editor do site www.tuliovianna.org) e Cynthia Semíramis Vianna (Mestre em Direito [PUC-MG] e Editora do site www.direitoinformatico.org). A eles o devido crédito.
No Porto, 14 de novembro de 2006 – republicado neste blog em Salto, 22 de Agosto de 2019.
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