Ortodoxia, Heresia e História Contrafactual: “A Teaser”
Eduardo Chaves
[Versão revisada em 1.10.2021]
1. Sorte ou Azar, ou, quem Sabe, Predestinação?
A seguir um trecho surpreendente de um artigo do filósofo Arthur Schopenhauer, que tem um título não menos surpreendente de “Especulação Transcendente sobre a Aparente Intencionalidade do Destino do Indivíduo”.
“Ao olhar para trás, sobre o curso de nossa própria vida, a gente constata que encontros e eventos que, quando se deram, pareciam fruto do acaso, vieram a se tornar aspectos estruturantes de uma história de vida não-intencional, através dos quais as potencialidades do nosso caráter foram tomando forma e se transformando em realidade. Ao se dar conta disso, é difícil resistir à conclusão de que o curso de nossa biografia se assemelha ao enredo de uma obra de ficção habilmente construída. E a gente fica apenas imaginando quem pode ter sido o autor desse enredo tão surpreendente!” [1]
Tempos atrás eu criei um conceito, ao qual dei o nome de “Provincidência” [2], para me referir a encontros e acontecimentos que, quando aconteceram, a gente considerou apenas fruto de coincidência, obra do acaso, mas que, em retrospectiva, vistos em contexto mais amplo, parecem fazer parte integrante, essencial mesmo, de um plano ou desígnio que, por ser tão sofisticadamente elaborado, não pode ser explicado simplesmente como fruto de coincidência ou obra de acaso, só podendo ser visto como um enredo cuidadosamente elaborado pela Divina Providência…
No filme Match Point, de Woody Allen, a cena inicial é fantástica. O filme começa com a música “Una Furtiva Lacrima” no fundo, enquanto passam os créditos de abertura… Depois aparece uma rede de tênis e uma bolinha passando de lá pra cá, de cá pra lá. De repente a bolinha bate no topo da rede esticada, sobe reto — e a imagem é congelada com a bolinha no alto. Uma voz em off diz:
“O homem que declarou ‘Eu preferiria ter sorte a ser bom’ entendia muito da vida. As pessoas têm medo de enfrentar a verdade de que uma grande parte de nossa vida depende exclusivamente da sorte. Assusta acreditar que muito na vida está fora de nosso controle. No, entanto, há momentos em uma partida de tênis em que a bolinha bate no topo da rede e, por uma fração de segundo, pode ir para frente ou cair para trás. Com um pouco de sorte ela vai pra frente, e você é o vencedor. Mas pode ser que ela não faça isso, e você perca a partida” [3].
O filme ilustra o princípio — mas a gente só percebe no fim, numa cena assaz surpreendente, que apenas o gênio de Woody Allen poderia produzir.
2. História Contrafactual
Existe um jeito de escrever a História, que tem o nome de História Contrafactual. Como já escrevi sobre isso, transcrevo um trecho de um artigo meu. Daqui até o final desta Seção 2, trata-se de texto que escrevi em 24.4.2019, no meu blog Chaves Space [4]:
[Início da citação do meu artigo anterior: 18 parágrafos].
Admitidamente, sou admirador da chamada “história contrafactual” (também conhecida como história alternativa, história especulativa, história hipotética, ou até mesmo história virtual). Estou convicto de que ela é um gênero legítimo de historiografia (e não apenas um pretexto para a ficção de fundo histórico).
História contrafactual é o exercício imaginativo de perguntar ‘ What if? ‘ (O que se?). O QUE teria acontecido na história subsequente SE um evento anterior, crucial, não tivesse acontecido, ou tivesse tido resultados diferentes? A pergunta é feita com o intuito de entender melhor o que de fato aconteceu.
É esse o entender dos historiadores Jeremy Black e Donald M. MacRaild, em seu livro Studying History [5]. Eles afirmam que a história contrafactual é, em sua raiz, a tentativa de conjeturar o que poderia ter acontecido no curso da história, se um crucial evento anterior não tivesse acontecido ou tivesse acontecido com resultados diferentes. Sua finalidade é entender melhor o que de fato veio a acontecer e por quê.
Comparem-se também, neste contexto, os livros Altered Pasts: Counterfactuals in History, de Richard J. Evans, com a contribuição de Hedva Ben-Israel [6], e Virtual History, editado por Niall Ferguson [7]. Outro livro interessante é If It Had Happened Otherwise, editado por John Collings Squire [8].
No livro de Squire discute-se a questão levantada por Sir Winston Churchill sobre o que teria acontecido com os Estados Unidos e com os americanos se Robert E. Lee tivesse ganho a Batalha de Gettysburg, em Julho de 1863, pelos Estados do Sul, na Guerra Civil Americana, em vez de George G. Meade, pelos Estados do Norte…
Niall Ferguson (o mesmo autor mencionado atrás), em seu livro The Pity of War: Explaining World War I [9], talvez seja o caso mais famoso e polêmico de história contrafactual – aqui praticada e não meramente descrita como uma possibilidade. Ferguson procura mostrar que, se a Alemanha tivesse ganho a Primeira Guerra Mundial, ela, muito provavelmente, não teria se tornado nazista em 1933, e o mundo não teria tido (entre outras realidades) Hitler, a Segunda Guerra Mundial, o Holocausto, o Surgimento da Guerra Fria… Acho essa tese extremamente plausível, mesmo que nunca possa ser comprovada.
Há muitos livros explorando esse tema, em relação às duas Guerras Mundiais, à Guerra Civil americana, à Guerra de Independência dos Estados Unidos, etc. Menciono alguns, embora em alguns casos o que temos é algo que fica entre História Contrafactual e Ficção de Base Parcialmente Histórica… A Segunda Guerra tem preferência, mas a Primeira Guerra também aparece. Eis alguns livros:
- Archduke Franz Ferdinand Lives!: A World without World War I, de Richard Ned Lebow [10].
- An Alternate History of the Third Reich: Empire Ascendant, 1940-50, de Gary Schreckengost [11].
- The Second World War: WW2 – An Alternate History, de Ralph Brandt [12].
- The D-day Landing Has Failed, de Ralph Brandt [13].
- The Reich Without Hitler: The Falcons of Malta, de Scott Palter & Mike Rohde [14].
Estou lendo, no momento, uma (enorme) biografia de Hitler — com quase mil páginas — e as mil páginas são um resumo de uma obra mais ampla, em dois volumes, com mais de duas mil páginas… O livro se chama Hitler: A Biography, e o autor é Ian Kershaw [15].
Já no Prefácio à nova edição (a edição resumida) Kershaw levanta uma questão importante e instigante. Hitler (nascido em em 1889) foi, até 1918, data do fim na Primeira Guerra Mundial, ou seja, até os seus 19 anos, um adolescente tímido, cheio de complexos e, segundo tudo indica, de problemas psicológicos (e sexuais) sérios. Quem olhasse o rapazote nunca iria imaginar que ele poderia um dia se tornar quem se tornou. Para que ele viesse a se tornar, a partir de 1933, o grande líder da Alemanha, é necessário que postulemos que o potencial de carisma, comunicação, liderança, etc., que ele veio a demonstrar, já estivesse presente nele — mas sem ter, contudo, condições de aflorar.
Do fim da Primeira Guerra em diante, Hitler gradualmente se tornou, do ponto de vista dos que o observavam, uma outra pessoa. Se imaginarmos que as pessoas têm um cabedal genético que pode ficar sem expressão ou pode se desenvolver, devemos admitir que Hitler mudou a partir de 1919, mas que sua mudança se deveu às circunstâncias em que a Alemanha, derrotada na Primeira Guerra Mundial, veio a se encontrar a partir daquela data: esmagada pelos seus inimigos, que tripudiaram sobre ela, cobraram-lhe impagáveis compensações, não deixaram que sua economia e sua cultura pudessem voltar a se desenvolver, e, por isso, criaram um sentimento forte de nacionalismo e de ressentimento contra os seus inimigos — agora no papel de vencedores cobrando o preço de seu esforço, de seu sofrimento, de sua destruição material, de suas mortes. Esse clima foi propício ao desenvolvimento, em Hitler, de características que até ali estavam nele dormentes.
Deixando de lado o livro de Kershaw (cuja leitura eu apenas comecei) e voltando à questão da História Contrafactual, se a Alemanha houvesse ganho a Primeira Guerra Mundial, ou, mesmo, tendo-a ganho os Aliados, se eles não tivessem humilhado a Alemanha como o fizeram, provavelmente Hitler não teria se desenvolvido como se desenvolveu, e não teríamos tido os Nazistas no poder, nem a Segunda Guerra, com o Holocausto, a Rússia / União Soviética não teria tido ocasião de vir a ocupar, na Europa do Leste, e, depois, mundialmente, o papel uma das duas grandes potências depois do fim da Segunda Guerra, a Guerra Fria não teria acontecido, etc.
Tudo isso é, naturalmente, especulação — mas é uma especulação séria que nos força a olhar para a Primeira Guerra com olhos diferentes, que nos leva a olhar para Hitler, do ponto de vista biográfico, com outros olhos, etc.”
[Fim da citação de 18 parágrafos do meu artigo anterior].
3. Ortodoxia e Heresia
Já anunciei, em meu perfil no Facebook, que estou escrevendo um texto — era para ser só um artiguete, mas está se tornando um livreto — sobre o seguinte conjunto de temas: Ortodoxia (Recta Doctrina), Heresia, e a questão básica da Liberdade de Pensar (inclusive da liberdade de crer, duvidar, e até descrer). No processo, discuto (e renego) a noção teológica cristã de fé como assentimento intelectual ao que diz a Bíblia e às doutrinas (supostamente derivadas da Bíblia) oficialmente aprovadas como ortodoxas nos principais Concílios Ecumênicos do Cristianismo Antigo: Concílio de Nicéia I (325), Concílio de Constantinopla I (381), Concílio de Éfeso (431), Concílio de Calcedônia (451), Concílio de Constantinopla II (553), Concílio de Constantinopla III (680) e Concílio de Nicéia II (787) [16].
Minha tese básica sobre Ortodoxia e Heresia, que não é novidade para quem leu meu livrinho Breve História da Igreja Antiga: Dos Primórdios à Queda do Império Romano no Ocidente [17], é a seguinte [18]:
A. O conceito de heresia (com o sentido de crença consciente em doutrina [opinião] comprovadamente errada ou falsa — heresia não é todo e qualquer erro de doutrina [ou opinião]) é parasítico ao conceito de ortodoxia (com o sentido de doutrina [opinião] oficialmente definida, por quem de direito, como certa ou verdadeira): não faz nenhum sentido, dentro de um determinado contexto, designar como herética, isto é, como errada ou falsa, a crença em uma doutrina [opinião] a menos que haja uma doutrina [opinião] oficialmente definida como ortodoxa, isto é, como certa ou verdadeira dentro daquele contexto [19];
B. Embora se possa e se deva presumir que os autores do Novo Testamento consideravam o que escreveram em seus 27 livros, como algo certo e verdadeiro, não havia, nos cerca de 300 anos iniciais do Cristianismo, até 325 AD, a definição oficial de uma ortodoxia, algo que só se deu a partir do primeiro Concílio Ecumênico, o de Niceia, realizado em 325 AD, mediante convocação do Imperador Constantino I (“O Grande”), que, na Igreja Cristã Ortodoxa, é São Constantino [20];
C. Mesmo presumindo-se a tese enunciada no item anterior, e dado o conteúdo dos textos que vieram, eventualmente, a constituir o Novo Testamento (cujo cânon só foi consolidado e considerado fechado depois, e a partir, do Concílio de Niceia, isto é, depois de 325 AD), é impossível deixar de reconhecer que: (a) os textos do Novo Testamento certamente não cobrem todos os tópicos sobre os quais seria interessante ou conveniente, se não necessário, ter uma opinião; (b) alguns conceitos, fatos e afirmações, no texto bíblico canônico, não são enunciados com a clareza e a especificidade desejada; (c) há divergências entre os relatos, os pontos de vista e os objetivos (teológicos, políticos e pragmáticos) de alguns autores; etc., constatações estas que tornam inviável definir determinadas doutrinas (opiniões) como heréticas (isto é, erradas e falsas) antes que haja um pronunciamento oficial sobre elas, por quem de direito;
D. No interior do próprio Novo Testamento há várias referências a divergências doutrinárias (ou de opinião), dentro da nascente igreja, já no primeiro século de vida da Igreja Cristã, alguns autores acusando determinadas pessoas (identificadas ou não) de serem falsos profetas, ou falsos mestres, ou semeadores de cizânia, divulgando ensinamentos errôneos, que precisariam ser corrigidos ou extirpados, etc.
E. Alguns dos fatos mencionados nos quatro itens anteriores levaram até mesmo uma pessoa insuspeita como Martinho Lutero, já no século 16, quase mil e quinhentos anos depois, a não considerar exata ou totalmente canônicos livros como a Epístola de Tiago, tendo suspeitas também sobre a canonicidade da Epístola aos Hebreus, cuja autoria foi, por muito tempo, atribuída a Paulo, e de alguns outros trechos do Novo Testamento considerado canônico pela maioria absoluta da Igreja Cristã desde o século 4;
F. Esses fatos, e, em especial, o fato incontestável de que o Cristianismo que surgiu na história, tendo tido origem no contexto judaico da Palestina, mas prosperando no mundo gentio, no Oriente Médio, na Europa, na África, e mesmo na Síria e na Pérsia, países em que a maioria absoluta da população não compartilhava a herança judaica do Velho Testamento, e aceitava teses filosóficas que nada tinham que ver com o pensamento hebraico, levam a esperar que, nos primeiros três séculos do Cristianismo, o que preponderava era a diversidade, e não a uniformidade de pensamento, fato que apenas foi alterado com a criação e construção, esta gradual e lenta, da ortodoxia, que, mesmo depois de aprovada em mais de um Concílio Ecumênico, não conseguiu eliminar totalmente o que, a partir da definição da ortodoxia, passou a ser corretamente chamado de heresia, agora com respaldo conceitual e linguístico;
G. Por fim, parece-me evidente, que: (a) se o Imperador Constantino não houvesse se convertido ao Cristianismo em 312 AD; (b) se ele não tivesse tornado o Cristianismo uma religião lícita no Império Romano, com o Édito de Milão, de 313; e (c) se o Imperador Teodósio, em 380 AD, não houvesse tornado o Cristianismo a única religião oficial do Império Romano, através do Édito de Tessalônica, tornando ilegal a opção de não ser cristão; SE TODAS ESSAS COISAS NÃO HOUVESSEM ACONTECIDO, dificilmente a minoritária, perseguida, pobre e desempoderada Igreja Cristã dos três primeiros séculos (anos 30 AD a 325 AD) teria tido infraestrutura administrativa e logística, condições políticas, respaldo econômico e poderio militar para realizar os Concílios Ecumênicos (globais, envolvendo, em princípio, os bispos de toda a Cristandade) em que a ortodoxia foi definida e criada, tornando possível a condenação e o expurgo da divergência, então caracterizada como herética.
Isso é o que penso e defendo sobre este assunto.
4. A História Contrafactual e a História do Cristianismo
Imaginemos, na linha do que consta no item “G” da seção anterior, (a) que Constantino e Teodósio não houvessem existido, ou (b) que o primeiro não tivesse se convertido ao Cristianismo e o segundo não tivesse sido cristão, ou (c) que os Éditos de Milão e Tessalônica não houvessem sido baixados, e (d) que os Concílios Ecumênicos globais, não houvessem acontecido. SE a história tivesse ido por aí, e não por onde de fato foi, o que teria sido do Cristianismo, descartada uma intervenção direta, explícita e radical da Divina Providência?
Os cristãos ortodoxos ou mais conservadores provavelmente responderão dizendo que a Providência Divina não opera, em regra, de forma “direta e explícita”, mas, sim, de forma oblíqua e mediada, através de interpostas pessoas, e, que, no caso de Constantino e Teodósio, o que eles fizeram nada mais foi, e nada menos, do que cumprir os ditames da Providência Divina, não sendo cabível, diante da onipotência e da soberania divina, imaginar que os fatos houvessem sido diferentes…
Pode ser. Mas é interessante imaginar. Entre outras coisas, o Cristianismo poderia hoje ser mais rico em alternativas intelectuais e mais diversificado, pois, provavelmente, (a) não teria havido, em sua história, o surgimento da noção de Ortodoxia, que tanto problema causou; (b) não teria havido a Inquisição no seio da Igreja Católica Romana; (c) nem, no seio do Protestantismo, em plena Genebra, Michel Serveto, teria sido executado (vale dizer, calculadamente assassinado — não digo “friamente” por ter sido no fogo), em nome da fé, entendida como assentimento intelectual à doutrina ortodoxa definida, representada, no caso, pela pelas Institutas da Religião Cristã [21]).
Esclareço que no meu artiguete / livreto, em andamento, eu não embarco em um exercício de História Contrafactual. Lido apenas com o que (segundo tudo indica) de fato aconteceu. Especular, de forma imaginativa, de vez em quando, é bom, mas para tudo há seu tempo e seu lugar.
5. Notas
[1] Encontrei essa passagem de Arthur Schopenhauer, em Inglês, no livro intitulado Joseph Campbell: A Fire in the Mind — The Authorized Biography, de Stephen and Robin Larsen (Inner Traditions, Rochester, VT, New Edition, 2002). A citação de Schopenhauer está na p.xvi (e não na p.xviii, como indica o Índice Remissivo [Index] do livro). No Índice Analítico [Table of Contents] do livro há vários outros erros de numeração de página. Aparentemente a “New Edition” teve apenas um novo Prefácio acrescentado, e foi usada, para o resto, a mesma diagramação, já numerada, da edição original, tornando as remissões, infelizmente, erradas. Uma editora de primeira linha não teria deixado passar esses erros primários. Lamentavelmente, os autores da biografia também não fornecem informação sobre onde, nas obras de Schopenhauer, está essa passagem citada. Informam apenas de que livro de Joseph Campbell eles retiraram a citação. Foi de The Inner Riches of Outer Space: Metaphor as Myth and as Religion [Harper & Row, New York, 1986], p.110. Depois de alguma pesquisa, encontrei na Internet uma cópia de um livreto de Schopenhauer, com o título (já em Inglês) de Transcendent Speculation on the Apparent Deliberateness in the Fate of the Individual, no site da City University of New York – CUNY, disponível no endereço https://hmakse.ccny.cuny.edu/wp-content/uploads/2018/02/Transcedent_Speculation-Arthur-Schopenhauer.pdf. Vale registrar que o título do artigo fornecido pelos autores da biografia de Campbell contém o termo “Intention” em vez de “Deliberateness”. Talvez os autores da biografia tenham usado outra tradução para o Inglês do texto, o que explicaria o fato de que eu, tendo corrido os olhos pelo livreto (que, em Inglês, formato .pdf, tem 23 páginas), não encontrei a passagem, tal e qual citada, embora o assunto seja certamente o mesmo. Outro problema com o livro de Stephen and Robin Larsen: há dois Prefácios, sem que se esclareça se mudou alguma coisa no texto do livro entre um Prefácio e o outro. Nenhum dos dois Prefácios tem data. Descobri, também, na subsidiária alemã da Amazon, que o texto original, em Alemão, do livro de Schopenhauer tem as seguintes referências: Arthur Schopenhauer, Transcendente Spekulation über die anscheinende Absichtlichkeit im Schicksale des Einzelnen (FV Editions, Kindle Edition) e que foi publicado originalmente em 1851. Em Alemão o texto está disponível em Schopenhauers sämmtliche Schriften in fünf Bänden, vol. 4, e, também isoladamente, na forma de ebook, padrão Kindle. (O termo “transzendent” está escrito no título das duas cópias da edição alemã da forma que transcrevi, “transcendent, e não como ele é grafado nos dicionários atuais, a saber, “transzendent“). A tradução do Inglês para o Português é minha, com base no texto fornecido pelos autores da biografia no Prefácio da Primeira Edição.
[2] Vide meu longo artigo “Uma Discussão sobre um Tema Atual”, no meu blog Liberal Space, no endereço https://liberal.space/2019/07/31/uma-discussao-sobre-um-tema-atual/.
[3] Vide dados sobre o filme Match Point (Ponto Final, em Português), no site de propriedade da Amazon especializado em filmes e cinema, IMDB – International Movie DataBase, e que está localizado no endereço https://www.imdb.com/title/tt0416320/reference. O texto do script do filme, com base no qual fiz a tradução, foi retirado do site Script Slug, no endereço https://www.scriptslug.com/assets/scripts/match-point-2005.pdf.
[4] Artigo “História Contrafactual”, publicado no blog Chaves Space, no endereço https://chaves.space/2019/04/24/historia-contrafactual/.
[5] Macmillan, 1997, 2000, 3.ed. 2007, seção 4.9 da terceira edição.
[6] Brandeis University Press, 2013.
[7] Basic Books, 1999.
[8] Longmans, 1931, 2.ed. rev. 1972.
[9] Penguin, 1998, 2.ed. rev. 2000.
[10] Saint Martin’s Press, 2014.
[11] Gary Schreckengost, Publisher, 2018.
[12] Ralph E. Brandt, Publisher, 2012.
[13] Ralph E. Brandt, Publisher, 2017.
[14] Final Sword Productions, 2018.
[15] Norton, 2008; Edição Resumida de dois volumes: Hitler, 1889-1936: Hubris (1998) e Hitler, 1936-1945: Nemesis (2000).
[16] Para um relato dos primeiros sete Concílios Ecumênicos do Cristianismo, vide Leo Donald Davis, The First Seven Ecumenical Councils (325-787): Their History and Theology (The Liturgical Press, Collegeville, MN, 1983).
[17] Mindware Education Editora, São Paulo, 2017 (versão impressa), 2018 (versão revista e ampliada, em ebook, formato Amazon Kindle), disponível na Amazon, em qualquer de suas lojas. No entanto, livros em formato ebook só podem ser adquiridos no site da Amazon no país em que o usuário tem conta. Assim, quem tem conta na Amazon brasileira só pode adquirir ebooks na loja brasileira da empresa. É lamentável, mas é assim, aparentemente por imposição, não da Amazon, mas das legislações locais.
[18] Minha tese depende, em linhas gerais, do conteúdo do livro de Walter Bauer, Rechtgläubigkeit und Ketzerei im ältestem Christentum, 1.ed. (Mohr Siebeck, Tübingen, 1934); 2.ed., com Georg Strecker (Mohr Siebeck, Tübingen, 1964); há tradução para o Inglês feita por uma Equipe de Onze Tradutores, coordenada pelos editores Robert A. Kraft & Gerhard Krodel, que teve como base a 2.ed. alemã. O título foi traduzido literalmente como Orthodoxy and Heresy in Earliest Christianity (Fortress Press, Philadelphia, 1971, 50 anos atrás neste ano de 2021; a tradução foi reimpressa por Sigler Press, Miflintown, PA, 1996). A tese de Walter Bauer sobre o desenvolvimento do Cristianismo nos primeiros séculos é hoje adotada por vários autores, tendo sido alavancada, entre outros, por Rudolf Bultmann, mas está longe de ser unanimemente aceita (como, de resto, acontece com qualquer assunto controvertido). A primeira crítica extensa da tese de Bauer feita em Inglês foi H. E. W. Turner, The Pattern of Christian Truth: A Study of the Relations between Orthodoxy and Heresy in the Early Church (A. R. Mowbray, 1954, reimpresso 50 anos depois por Wipf & Stock, Publishers, Eugene, OR, 2004). Esse livro foi publicado dezessete anos antes de sair a tradução do livro de Bauer para o Inglês. Quando saiu a tradução de Rechtgläubigkeit und Ketzerei para o Inglês, em 1971, foram incluídos dois extensos Apêndices escritos por Georg Strecker, que figura como coautor da 2a.ed. O Segundo Apêndice, intitulado “The Reception of the Book” (A Recepção do Livro) resume e discute resenhas da 1a.ed., positivas e negativas, publicadas em Alemão, e um dos editores da tradução para o Inglês, Robert A. Kraft, complementou esse apêndice com uma análise de resenhas em Inglês, dedicando considerável atenção e espaço à descrição e análise do livro de H. E. W. Turner. Por fim, mais recentemente, foi publicada em Inglês uma coletânea de críticas à tese de Bauer: Paul A. Hartog, ed., Orthodoxy and Heresy in Early Christian Contexts: Reconsidering the Bauer Thesis (Pickwick Publications, Eugene, OR, 2015). É curioso que Bauer não usa o termo “Orthodoxie“, mas prefere o termo composto “Rechtgläubigkeit“, que pode ser considerado sinônimo de “Orthodoxie” ou traduzido literalmente como “Reta Credibilidade” ou “Credibilidade Correta”.
[19] Este item da tese, que afirma que o conceito de heresia é parasítico ao conceito de ortodoxia, e que, portanto, não faz sentido falar em heresia se não há a imposição de uma ortodoxia, é defendido por muita gente, até por autores dos quais eu discordo em vários outros aspectos neste assunto. Roger E. Olson, por exemplo, em seu livro Counterfeit Christianity: The Persistence of Errors in the Church (Cristianismo Falsificado: A Persistência de Erros na Igreja), afirma e reitera esse item da tese. Diz ele, logo nas primeiras páginas do primeiro capítulo: “Heresia depende de ortodoxia. Ortodoxia é correção [correctness, “corretude”] teológica e doutrinal — crença certa. Heresia não é só erro: é a afirmação e aceitação consciente de um erro que nega a ortodoxia. … Heresia depende de ortodoxia. Onde não há ortodoxia, onde não há um corpo de crenças teologicamente correto, é difícil falar em heresia. … Em um contexto social pluralista, em que não há uma igreja estatal, oficial, ou, então, em que as igrejas ou denominações [ainda que não estatais ou oficiais] não colocam em vigor e impõem um critério ou padrão que define qual é a ortodoxia dentro da instituição, é difícil falar em heresia.” (Abingdon Press, Nashville, 2015, pp.3,6, com uma pequena mudança na ordem das afirmações; tradução minha; ênfase no original). Concordo sem ressalvas com essa afirmação.
[20] Embora Alister E. McGrath, no primeiro capítulo de seu livro Heresy: A History of Defending the Truth (Heresia: Uma História em Defesa da Verdade) [original em Inglês: HarperCollins, New York, ebook Kindle s/d; tradução para o Português de José Carlos Siqueira, Editora Hagnos, São Paulo, 2014], se refira em tom quase de deboche, ao fato de que esse item da minha tese é defendido por Dan Brown em The Da Vinci Code (O Código da Vinci), afirmando que o diálogo que vou citar a seguir sofre de “risível imprecisão” (“risible inaccuracy“), a evidência histórica está do lado de Dan Brown, e este item da tese está longe de ser invenção de um dos personagens de uma obra de ficção, que só aproveita o resultado de trabalho sério de inúmeros estudiosos do Novo Testamento e dos primeiros anos do Cristianismo na história. Eis o diálogo que McGrath diz sofrer de “risível imprecisão”: “Teabing [um personagem] declara: — Jesus de Nazaré nunca foi considerado divino pelos cristãos até o Concílio de Niceia, em 325, quando o assunto foi levado a votação. E só foi aprovado com dificuldade. … Sophie Neveu [outro personagem] fica chocada com essas palavras: — Não estou entendendo, a divindade de Jesus? — Minha querida [continua Teabing], até aquele momento da história Jesus tinha sido visto pelos seus seguidores como um profeta mortal; […] um grande homem, e poderoso, mas apesar de tudo, um homem. Um mortal. — Não como o Filho de Deus? [retruca Neveu.] — Exatamente [continua Teabing]. O estabelecimento de Jesus como ‘Filho de Deus’ foi oficialmente proposto e votado no Concílio de Niceia. [Neveu volta a falar.] — Espere um momento. Está a dizer-me que a divindade de Jesus resultou de uma votação? [Conclui Teabing.] — E bastante renhida, por sinal“. Cito apud McGrath, seguindo a tradução brasileira do texto, pp.11-12, que salienta (ele próprio) ser essa uma “tradução livre” da passagem de Dan Brown [que estaria na p.233 da tradução brasileira de seu livro]. Embora McGrath procure buscar apoio até no livro de Bart D. Ehrman, Truth and Fiction in the Da Vinci Code: A Historian Reveals What We Really Know about Jesus, Mary Magdalene, and Constantine (Oxford University Press, Oxford, 2004), autor com o qual ele normalmente não concorda, o que o personagem Teabing de Dan Brown está afirmando é que oficialmente (essa palavra é usada no texto) Jesus de Nazaré só foi considerado plenamente divino pela Igreja Cristã no Concílio de Niceia, o que não deixa de ser verdade. Pode ser que, sendo obra de ficção, Dan Brown pinte as coisas em cores um pouco mais fortes do que o fariam os estudiosos do Novo Testamento (o “nunca” usado na primeira frase certamente é um exagero), mas é só. O que Ehrman afirma nesse seu livro (que foi escrito para aproveitar a popularidade da celeuma criada pelo livro de Dan Brown, e pelo filme feito com base no livro, foi textualmente o seguinte: “It’s absolutely not true that Jesus was not considered divine until the Council of Nicea, that before that he was considered merely as ‘a mortal prophet’ (p. 233)” [É absolutamente não verdadeiro que Jesus não era considerado divino até o Concílio de Nicea, e que, antes, ele era considerado meramente um ‘profeta mortal’ (p.233).]A afirmação que Ehrman deveria ter feito, como ele bem sabe, é: “It’s true that Jesus was not officially considered fully divine by the Christian Church until the Council of Nicea” [É verdade que Jesus não foi oficialmente considerado plenamente divino pela Igreja Cristã até o Concílio de Niceia]. Essa frase é absolutamente verdadeira, e Ehrman sabe disso. Antes de Niceia (e mesmo depois), havia cristãos que achavam que Jesus não era divino (os Ebionitas, por exemplo), havia cristãos que achavam que ele não era humano (os Marcionitas, por exemplo), havia cristãos que achavam que ele era divino e humano (como os Proto-Ortodoxos, por exemplo), e havia cristãos que achavam que ele não era bem nem uma coisa nem outra, sendo uma entidade única, irrepetível, como, de resto, Ehrman deixa claro na sequência do seu texto (onde ele afirma, tentando fazer graça, “some thought he was so divine he wasn’t even human!” [Alguns acreditavam que ele era tão divino que nem chegava a ser humano]. Ehrman é um competente estudioso do Novo Testamento e dos primórdios do Cristianismo, mas é, acima de tudo, um escritor extremamente hábil em fabricar best sellers, produzindo, um depois do outro, em série, livros que vendem muito bem. A inserção do “absolutely”, antes de “not true” é um truque de escritor tarimbado que sabe que está tangenciando perigosamente a questão, e possivelmente induzindo alguns leitores ao erro, mas fazendo uma afirmação tecnicamente verdadeira. Em outros livros seus, como, por exemplo, em The New Testament: A Historical Introduction to the Early Christian Writings (3.ed, Oxford University Press, Oxford, 2004), publicado no mesmo ano e pela mesma editora que o livro sobre o best seller de Dan Brown, ele não só admite, como declara, ao longo do primeiro capítulo, exatamente o que eu esclareci atrás, no parágrafo iniciado por “Antes disso”. É impossível ter cuidado demasiado na leitura de um autor hábil e vaidoso, cuja ética de vez em quando vacila.
[21] Institutas da Religião Cristã é a versão genérica do título em Português do opus magnum de João Calvino, o controlador (alguns o chamam de o ditador) de Genebra por ocasião da desumana execução de Michel Serveto, por heresia. Chamar uma execução de desumana é sublinhar o fato de que, mesmo concedendo, ad argumentandum, a execução, de todas as formas de execução possíveis, ela é a que mais sofrimento inflige: a fogueira de fogo lento. Foi nela que Serveto foi torrado.
Em Salto, 27 de Setembro de 2021; revisado em 1 de Outubro de 2021.
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